17/05/2022 às 16h47min - Atualizada em 18/05/2022 às 11h31min

Crise Econômica, Inflação e aumento global de preços: o cenário pós-pandemia justifica a revisão de Contratos?

Após dois anos de pandemia da Covid-19, não é novidade dizer que muitas empresas estão sofrendo com a alta de preços, tanto no mercado internacional, como no nacional

SALA DA NOTÍCIA Daniela Nucci
Divulgação

Após dois anos de enfretamento a covid-19, não é novidade dizer que muitas empresas estão sofrendo com a alta de preços (agora influenciada também pelo conflito Ucrânia e Rússia), tanto no mercado internacional, como no nacional.

Como advogada e sócia de um escritório com foco no direito empresarial, tenho  observado empresas, com contratos em andamento, buscando alternativas jurídicas para conseguir reajustar seus preços no decorrer da contratação e antes do prazo de 12 meses (que é quando, usualmente, os preços sofrem reajuste com base em índices predefinidos pelos  contratantes).

Mas será que, atualmente, podemos usar o aumento inflacionário para revisar os valores contratados? Podemos usar a chamada teoria da imprevisão para pleitear a revisão dos valores contratados?

De acordo com a teoria da imprevisão, se uma situação imprevista e imprevisível faz com que a execução do contrato se torne extremamente onerosa a uma das partes, é possível o pleito de rescisão do contrato pela parte prejudicada sem qualquer ônus/penalidade. A outra parte, por sua vez, tem a faculdade de propor a revisão dos termos do contrato para reestabelecer o equilíbrio econômico entre as partes contratantes.

Dentre os critérios legais para aplicação desta teoria, por exemplo, há exigência para que o tipo do contrato seja daqueles em que a parte deve realizar a obrigação de forma contínua ou ao longo de determinado tempo. Mas e os contratos futuros? Eles atendem aos requisitos legais para aplicação da teoria da imprevisão?

Pela interpretação do judiciário, os contratos futuros são  aqueles em que a parte se obriga a entregar o bem em determinada data futura. E eles não são classificados como contratos de execução continuada ou diferida. Como exemplos, citamos os contratos de compra e venda de comodities ou equipamentos, com uma  data de entrega futura e determinada, sendo que as etapas para atendimento das obrigações contratuais, por si só, não permitem  a aplicação da teoria da imprevisão.

A situação pandêmica atual foi interpretada como sendo uma situação imprevisível e serviu, juntamente com a demonstração de alteração da base econômica dos contratos, para justificar a revisão de diversos contratos que haviam sido firmados antes do seu início e teriam a sua execução concretizada durante a pandemia.

Ações revisionais foram propostas com objetivo de diminuir o impacto negativo vivenciado pelas partes em decorrência de expressivos reajustes ou permitir a rescisão dos respectivos contratos sem incidência de penalidades, tendo como base a teoria da imprevisão.

Grande parte das decisões se mostraram favoráveis a tal tese no início, reconhecendo que, de fato, a pandemia trouxe impactos imprevisíveis à economia e aos contratos de execução continuada por conta, dentre outros fatores, do aumento dos preços de forma global e escalonada.

O cenário não é o mesmo para as contratações que foram realizadas no curso da pandemia (a partir de março de 2020). Muitos juízes têm entendido que, na atual conjuntura, os contratantes já estão cientes de seus riscos e que é possível minimizá-los mediante adoção de ferramentas pré-contratuais e/ou contratuais – dentre elas cláusulas de gatilho para antecipação de reajuste ou mero repasse de custos atrelados ao objeto contrato.

Assim, é cada vez mais distante da atual realidade, o entendimento de que a pandemia do COVID-19 – mesmo que ainda com consequências nos fatores econômicos, como inflação, escassez de matéria prima e aumento do dólar – inviabilize muitos negócios em curso.

Neste sentido, é importante observar que a simples alta de preços, por si só, não é suficiente para justificar a aplicação da teoria da imprevisão e, consequentemente, a revisão dos contratos. Entendemos que a revisão dos contratos somente está autorizada em situações muito específicas e desde que devidamente justificada. Significa dizer que, ausentes os requisitos legais, a revisão – pelo Poder Judiciário – não será possível.

Assim, antes de afirmar se é possível ou não aplicarmos a teoria da imprevisão para renegociar ou revisar contratos, especialmente aqueles firmados durante a pandemia COVID-19, é necessário identificar o tipo de contrato, o objeto e as demais condições constantes do contrato.

E se ausentes os requisitos determinados na lei, dentre eles ser o contrato de execução continuada ou diferida, as chances de sucesso em um processo judicial de revisão serão mais baixas. 

A solução pode, todavia, estar na mão dos próprios contratantes, que por meio de uma negociação extrajudicial ou mediação privada e auxílio de profissionais da área jurídica, podem ter sucesso na  revisão do contrato para minimizar o impacto financeiro negativo, seja com fornecedores, seja com clientes.

Juliana Bertani é advogada e sócia do escritório BPN Advogadas 


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