10/07/2018 às 05h00min - Atualizada em 10/07/2018 às 05h00min

Renúncia de Johnson expõe graves fraturas entre conservadores britânicos

Governo de Theresa May fracassa em fazer valer acordo de dias antes e se vê ameaçado

Agência O Globo -
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Johnson: o conservador era um dos membros do Governo mais favoráveis a um "brexit" duro (Simon Dawson/Reuters)

LONDRES - Mais do que uma enorme mudança no Gabinete da primeira-ministra Theresa May, a renúncia do chanceler britânico, Boris Johnson, um dos principais defensores do Brexit — a saída do Reino Unido da União Europeia (UE) — escancarou a cisão dentro do Partido Conservador. A legenda se vê dividida entre alas “suave” e “linha-dura” em relação ao processo, que deve ser completado até as 11h (hora local) do dia 29 de março de 2019. A saída de Johnson e a nomeação do ex-ministro da Saúde Jeremy Hunt como novo chanceler geram temores de que a liderança de May seja contestada, e que o Parlamento possa levar a questão a votação.

“O Brexit deveria trazer oportunidades e esperança”, afirmou Johnson na carta de renúncia. “Deveria ser uma chance para fazer as coisas de maneira diferente, de ser mais ágil e dinâmico e maximizar as vantagens do Reino Unido como uma economia global aberta ao mundo. Esse sonho está morrendo, sufocado por dúvidas e incertezas desnecessárias (...) Parecemos caminhar para um ‘semi-Brexit’, com grandes porções da economia ainda ligadas ao sistema da UE, mas sem controle britânico.”

 

Em diversas ocasiões, Johnson já havia demonstrado desconforto com a estratégia da primeira-ministra, e, em comentários recentemente revelados pela imprensa britânica, descreveu o governo dela como “covarde”, comparando o estilo de negociação da premier ao do presidente americano, Donald Trump. Ontem, disse que o país caminha no rumo de tornar-se “uma colônia” da UE.

Em pronunciamento, May já havia expressado descontentamento com o rumo das negociações com o bloco, afirmando que as opções apresentadas por Bruxelas eram “inaceitáveis”, e destacando que seu Gabinete já iniciara preparações para um cenário no qual um acordo não fosse alcançado.

— Se a UE continuar nesse caminho, há um sério risco de que não cheguemos a um acordo, e um governo responsável deve estar preparado para um amplo leque de possíveis resultados — afirmou a premier a parlamentares. — Uma saída súbita e dura, sem qualquer acordo a respeito de comércio, alfândegas ou imigração teria consequências profundas tanto para o Reino Unido quanto para a UE.

No entanto, tais preparações não foram suficientes para satisfazer parte da ala linha-dura dos defensores do Brexit. Antes mesmo de Johnson, o secretário britânico para as negociações da saída, David Davis, anunciou sua renúncia no domingo por “não ser capaz, em sã consciência, de defender publicamente a posição do governo”. Juntamente com Davis, Steve Baker, importante nome da campanha pela saída britânica, que atuou como vice-secretário para o Brexit, também anunciou sua renúncia, gerando especulações de que mais nomes abandonem o Gabinete de May nos próximos dias.

— Se não nos unirmos, corremos o risco de eleger (o líder do Partido Trabalhista) Jeremy Corbyn como primeiro-ministro — afirmou um membro do Gabinete ao “Guardian”, após uma reunião de uma hora, a portas fechadas, entre May e seus ministros. — Pelo menos uma dúzia de pessoas repetiu esse argumento, e a primeira-ministra concordou, afirmando que o que é bom para o país é um governo do Partido Conservador.

De acordo com o ministro ouvido pelo “Guardian”, apesar do clima de divisão entre os conservadores, o partido não deve pedir voto de desconfiança sobre May ao Parlamento. Para isso seria necessário apoio de ao menos 48 parlamentares da legenda. Muitos acreditam que May sobreviveria a uma votação sobre a confiança em seu governo, mas reconhecem que ela enfrentaria forte competição pelo cargo, que incluiria, entre outros nomes, Johnson.

 

Em sua carta de resposta, May disse estar surpresa e afirmou que lamentava a partida do ministro, mas frisou que o ex-chanceler estava certo em renunciar, uma vez que não era capaz de apoiar seus planos para o Brexit: “O acordo apoiado pelo Gabinete após uma série de discussões produtivas honrará o resultado do referendo e permitirá que o Reino Unido retome o controle de suas fronteiras, leis e recursos.”

As turbulências que sacodem o Partido Conservador surgem dias antes da visita de Trump, um forte defensor do tipo de ruptura defendida pela linha-dura dos apoiadores do Brexit. Embora a premier tenha a expectativa de deixar o encontro com garantias de que os EUA estão prontos para assumirem acordos comerciais bilaterais com Londres, nas últimas semanas várias empresas britânicas alertaram para os perigos do Brexit. A Jaguar Land Rover, uma das principais montadoras do país, afirmou que um acordo caótico de saída da UE poderia custar mais U$ 100 bilhões aos investimentos da empresa e forçá-la a fechar fábricas.

A posição atual do governo britânico rejeita a exigência da UE de livre movimentação de pessoas através das fronteiras, mas permite que bens transitem sem problemas entre a República da Irlanda (que pertence ao bloco europeu) e a Irlanda do Norte (parte do Reino Unido). Ainda não está claro se a UE concordará com esse cenário.


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