Para quem acompanha a Fórmula 1 mais recentemente, as entradas do safety car são até comuns. Basta haver um incidente mais sério, que a direção de prova agita a bandeira amarela e um carro de segurança entra na pista para reagrupar os carros a uma velocidade bem mais baixa, com o objetivo de preservar a integridade da corrida e evitar novos problemas.
Oficialmente, o safety car faz parte do regulamento da categoria desde 1992, mas há um registro anterior de intervenção de um carro de segurança: foi há exatos 45 anos, no dia 23 de setembro de 1973 durante o GP do Canadá, em Mosport Park. Tal medida foi adotada pelos organizadores locais, e causou uma confusão daquelas...
O campeonato de pilotos já chegou decidido ao Canadá. Jackie Stewart já era o campeão mundial desde a corrida anterior, na Itália. A disputa era pelo vice-campeonato, entre François Cevert, companheiro do escocês na Tyrrell, e a dupla da Lotus, formada por Emerson Fittipaldi e Ronnie Peterson. Apesar dessa "disputa" em jogo, esperava-se um fim de semana mais relaxado. Nos treinos, Peterson fez a pole, seguido por dois pilotos da McLaren, Peter Revson e Jody Scheckter. Emerson era o quinto, atrás de Carlos Reutemann (Brabham). Cevert foi o sexto e Stewart, o nono.
Chovia na hora da largada, e Peterson manteve o primeiro lugar seguido por Scheckter. Em terceiro estava o surpreendente Niki Lauda, com o mediano carro da BRM, vindo de oitavo no grid. Para surpresa de todos, o austríaco assumiu a liderança logo na terceira volta, graças ao excelente desempenho de seus pneus Firestone no molhado - Peterson e Scheckter usavam Goodyear.
Lauda à frente de Peterson no GP do Canadá de 1973 — Foto: SportsCarDigest.com
Lauda não só assumiu a liderança, como abriu rapidamente boa vantagem sobre sueco, enquanto Emerson começava seu bom progresso na corrida, ultrapassando Scheckter e reduzindo a desvantagem para o companheiro. Aos poucos, porém, a pista começou a secar, o que deixou uma dúvida na cabeça dos pilotos sobre o momento certo de fazer as trocas para pneus slicks, já que as operações nos boxes eram lentíssimas naqueles tempos.
Na 16ª volta, Peterson abandonou a corrida após bater de frente no guard rail, o que levou Emerson ao segundo lugar e o também surpreendente Jackie Oliver, com uma Shatow, à terceira posição, à frente de José Carlos Pace (Surtees-Ford, com pneus Firestone).
Ainda na liderança, Lauda foi o primeiro a arriscar uma troca para pneus slicks, na 20ª volta, mas o pit stop foi absolutamente desastroso, e o austríaco voltou à pista em oitavo, mesmo com a vantagem que havia conseguido nas primeiras voltas. Emerson assumiu a ponta, à frente de Oliver, Cevert e Stewart subiram para terceiro e quarto.
Cevert fez a troca de pneus na 29ª volta e voltou em sexto. Mas no 32º giro, o francês sofreu um forte acidente e machucou os pés. Uma ambulância entrou na pista, dada a dificuldade de Cevert em deixar o carro, sem contar que Scheckter também atingiu a Tyrrell. A direção de prova canadense, acostumada a esse tipo de procedimento, já comum na América do Norte, mandou à pista o safety car, um Porsche 914, para juntar os carros. Aí o caos se instalou em Mosport Park.
Na volta em que Cevert bateu, Emerson havia entrado nos boxes para a troca de pneus, o que deixara Stewart na liderança, à frente de Jean Pierre Beltoise e Jackie Oliver (este já com pneus slicks). O condutor do safety car, o piloto Eppie Witzes, foi orientado a esperar a chegada de Stewart para entrar na pista e levar a fila de carros atrás dele. Só que nesta mesma volta o escocês entrou nos boxes, e o co-piloto do carro de segurança, Peter McIntosh, perguntou à direção de prova quem estava liderança. Equivocadamente, a orientação foi entrar à frente da BRM de Howden Ganley.
Na verdade, Ganley era o quarto colocado, e o safety car deixou passar erradamente o trio formado por Beltoise, Oliver e Revson. Estes então alcançaram o pelotão, ganhando uma volta em relação a todos os outros. O safety car ficou na pista por dez voltas, e, na relargada, os três tinham uma enorme vantagem.
Logo após a bandeira verde, Emerson tomou o quarto lugar e passou a impor um forte ritmo, fazendo a melhor volta diversas vezes. Naquele momento, o brasileiro imaginava ser o líder da corrida e seu ritmo era tão melhor, que Fittipaldi ainda alcançou e ultrapassou Beltoise e Oliver. Revson, com um carro mais competitivo, estava mais à frente e não pôde ser alcançado.
Quando Emerson cruzou a linha de chegada no que seria a sua última volta, Colin Chapman lançou seu chapéu ao ar como fazia em todas as vitórias da Lotus, mas a bandeira quadriculada não foi agitada de imediato. A direção de prova, ainda em parafuso, deu a bandeirada para outros pilotos que vinham atrás de Emerson.
O brasileiro chegou a subir ao degrau mais alto do pódio e a bandeira brasileira até foi hasteada. Mas depois começaram os protestos e, depois de muita confusão, Revson foi declarado vencedor, com Fittipaldi em segundo, oficialmente a 32 segundos do americano, e Oliver em terceiro.
Emerson, que ainda vinha da frustração pela ausência de ordens de equipe na prova da Itália para mantê-lo com chances de título, ficou inconformado. Até hoje, 45 anos depois, o brasileiro não poupa críticas à direção de prova candense pela enorme confusão em Mosport Park. Afinal, a melhor volta em Mosport era de 1m13 e Emerson terminou apenas 32 segundos atrás. Ou seja, era perfeitamente possível que Fittipaldi somasse mais uma vitória aos compêndios da F1.