Quem acompanha notícias sobre a guerra na Ucrânia em canais em língua inglesa possivelmente já ouviu falar de Sarah Ashton-Cirillo. A cidadã americana de 45 anos chegou à Ucrânia logo após o início da guerra de agressão da Rússia, em fevereiro de 2022. Jornalista freelancer residente em Las Vegas, ela queria originalmente fazer reportagens na linha de frente do conflito. Porém pouco tempo depois de chegar ao país sob invasão, acabou decidindo se juntar às Forças de Defesa Territorial (FDT) da Ucrânia.
Hoje ostentando uma patente de sargento do Exército ucraniano, Ashton-Cirillo chegou a ser ferida em campo de batalha em fevereiro de 2023. Após sua recuperação, foi designada para trabalhar no aparato de mídia em língua inglesa das FDT e, mais tarde, nomeada como uma de suas porta-vozes. Suas declarações extremamente duras em relação à Rússia, combinadas com sua identidade transgênero, fizeram dela um alvo favorito dos propagandistas russos e de trolls pró-Kremlin nas redes sociais.
A unidade não especificou quais declarações provocaram a suspensão, limitando-se a afirmar que uma investigação está em curso e que a suspensão prosseguirá até a conclusão. Mas pouco antes da sua suspensão, Ashton-Cirillo trocou farpas nas redes com o senador republicano J.D.Vance, que zombou publicamente da sua identidade de gênero e a acusou de pedir o assassinato de opositores do apoio americano à Ucrânia.
Ashton-Cirillo afirmou à DW que o ódio dirigido a ela nas redes sociais é um sinal de que seu trabalho é eficaz: "As palavras dos haters russos não me afetam. Eu estive na linha de frente, todos os meus colegas estiveram na linha de frente, e não me refiro apenas a jornalistas. Nós lutamos na linha de frente. E vimos a vida e vimos a morte. As palavras não importam quando você entende que suas ações vão contribuir não apenas para a libertação da Ucrânia, mas também para salvar vidas ucranianas e russas."
Não há dúvida que as palavras de Ashton-Cirillo causam impacto. Prova disso foi justamente a controvérsia que provocou sua suspensão, inicialmente desencadeada por um vídeo publicado por ela na rede X (antigo Twitter). Na gravação, ela afirma que "os propagandistas criminosos de guerra da Rússia serão todos caçados".
Pouco depois, voltou à carga, afirmando que pretendia caçar especificamente um "propagandista do Kremlin": "Na semana, os dentes dos demônios russos rangerão ainda mais, suas bocas raivosas espumarão num frenesi incontrolável, enquanto o mundo vai ver um propagandista favorito do Kremlin pagar pelos seus crimes", disse Ashton-Cirillo a partir de um estúdio das FDT, sem nomear quem seria o indivíduo em questão. "E este fantoche de Putin há de ser só o primeiro."
"Preocupo-me que os recursos americanos possam estar apoiando a violência ou a ameaça de violência contra quem expressa o que pensa. É de se notar que qualquer crítico da política incoerente dos EUA na Ucrânia já foi caluniado como propagandista, inclusive vários candidatos presidenciais e jornalistas americanos."
Em mensagens no X, Vance chamou ainda Ashton-Cirillo de "louca" e "esquisitona" comentando que seus vídeos pareciam um "esquete do [programa de comédia] Saturday Night Live". "Fiquei chocado quando descobri que se tratava de uma pessoa de verdade", disse, em entrevista ao canal ultraconservador Fox News.