21/09/2023 às 10h15min - Atualizada em 21/09/2023 às 10h15min

Intolerância religiosa: MP diz que polícia de Campinas deixa de registrar 65% dos casos e faz alerta a delegados

Subnotificação está ligada à tipificação equivocada de ocorrências, diz promotor. Inquérito civil analisou denúncias dos últimos três anos em associações, órgãos públicos e delegacias.

AB Notícia News
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: Fernando Pacífico/g1

Dados obtidos pelo Ministério Público (MP-SP) por meio de um inquérito civil revelaram que a polícia de Campinas (SP) deixou de registrar 65% dos casos de intolerância religiosa ocorridos na metrópole nos últimos três anos. Frente à subnotificação, a promotoria expediu uma recomendação aos delegados sobre a tipificação dos crimes (saiba mais abaixo).

️ Como o MP-SP fez a apuração? Instaurado em janeiro de 2022, o inquérito civil coletou e cruzou informações das delegacias da cidade, de associações da sociedade civil e órgãos públicos como o Centro de Referência em Direitos Humanos na Prevenção e Combate ao Racismo e à Discriminação Religiosa, ligado à prefeitura.

 

“Solicitamos os casos de registros de intolerância religiosa, casos criminosos, recebidos por esses órgãos, que não são órgãos policiais, e depois requisitamos informações para os órgãos policiais para saber se havia uma equivalência dos registros, e a conclusão é de que existe uma clara subnotificação”, detalha o promotor de Justiça de Direitos Humanos, Daniel Zulian.

 Por que há subnotificação? Ainda segundo o promotor, a falta de registros e apuração formal está ligada ao fato de que, em muitos casos, as ocorrências perdem a motivação de intolerância ao chegarem às autoridades.

 

“Eles viram, por exemplo, uma briga de vizinhos. Alguém que picha o muro de um centro de umbanda, a conotação que se dá é um conflito de vizinhança. Ou seja, não se registra devidamente como um ato de intolerância. E essa subnotificação gera um reforço da intolerância religiosa que existe hoje”, destaca Zulian.

 

? O que motivou o inquérito? À época da abertura, o MP-SP recebeu uma representação da Associação dos Religiosos de Matriz Africana de Campinas (ARMAC) solicitando “providências urgentes” em relação à preservação de locais de culto.

No documento, a associação relatou receber denúncias sobre “pedradas, depredação e violação do sagrado” em terreiros. Dentre os casos usados como exemplos, há registros de pichações recorrentes e até fezes de animais arremessadas em direção aos templos.

Ao g1, a diretora de Relações Institucionais da ARMAC, Edna Almeida Lourenço, ressaltou que os atos de intolerância estão diretamente relacionados ao racismo, “subestimando e tentando reduzir tudo que é de origem e tradição de matriz africana”.
 

️ E o que foi feito? Em agosto, o MP-SP expediu uma recomendação a todos os delegados e ao Departamento de Polícia Judiciária de São Paulo Interior 2 (Deinter-2) para ficarem atentos futuramente à possível existência de motivação baseada em intolerância religiosa nos registros das ocorrências.

 

“Se a autoridade policial não registra devidamente que aquela motivação foi religiosa, ou seja, que aquela conduta eventualmente de uma agressão física ou verbal partiu com uma motivação de intolerância, a própria classificação daquele crime vai ser diferente e vai se perder essa conotação mais grave da conduta”, diz o promotor Daniel Zulian.

Na recomendação, a promotoria pede às autoridades policiais que:

 

  • Observem a existência de intolerância religiosa em ocorrências; quando presente, a motivação deve constar expressamente nos registros, assentos e termos;
  • Enquadrem adequadamente ao crime de intolerância religiosa as ocorrências baseadas em “expressões ou atos descriminatórios generalizados”, ou seja, não dirigidas a uma única pessoa;
  • Orientem constantemente servidores e funcionários da delegacia sobre o tema, incluindo o tema na formação regular dos policiais civis e demais prestadores de serviços.

 

Além disso, em outubro de 2022, templos da metrópole puderam aderir à Central Integrada de Monitoramento de Campinas (CIMCamp), sistema de monitoramento da prefeitura de Campinas. Conforme consta no inquérito, a medida ajudou a inibir novos ataques.

 


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