31/08/2023 às 10h23min - Atualizada em 31/08/2023 às 10h23min

Crise de opioides: as 'máquinas de refrigerante' que dão antídoto de overdose em ruas dos EUA

Diante da escalada de mortes por overdose de fentanil, droga 100 vezes mais potente que a morfina, cidades americanas usam máquinas de venda automática para distribuir o antídoto para o opioide, seringas e outros recursos de redução de danos.

AB Notícia News
g1
MARIANA SANCHES / BBC NEWS BRASIL

Para quem passa pela calçada de uma das ruas de Washington D.C., a máquina ali instalada pode parecer só mais uma daquelas com opções de refrigerantes, isotônicos e água, comuns na capital americana.

Mas as prateleiras estão carregadas de sprays nasais anti-overdose por opioide, fitas de testagem rápida de drogas, testes rápidos de HIV, preservativos femininos e masculinos, kits de higiene básica e de tratamento para ferimentos.

Para consumir, basta digitar o número do produto escolhido e, em vez do cartão de crédito, inserir um código recebido imediatamente — e anonimamente — por quem liga para o número telefônico inscrito na própria máquina.

 

Tudo de graça e disponível 24 horas por dia, nos sete dias da semana.

As sete máquinas automáticas de redução de danos começaram a ser instaladas a poucas quadras da Casa Branca e do Capitólio há quatro meses — e uma oitava entrará em operação na capital americana nas próximas semanas.

A estratégia é a um só tempo atestado da gravidade da epidemia de overdoses por opioides que os Estados Unidos enfrentam e exemplo da criatividade e da agilidade que lidar com o problema tem exigido das autoridades públicas do país.

Enquanto, em 2015, o número de mortes por overdose de drogas em Washington ficou em 114 (ou 17 por 100 mil habitantes), em 2021, já eram 426 (ou quase 62 por 100 mil), mais do que o dobro da taxa de homicídios da cidade, segundo dados oficiais.

Nacionalmente, a tendência na escalada das mortes é similar. Segundo informações do National Institute of Health, em 2015, 52,4 mil pessoas morreram nos Estados Unidos por overdose. Em 2022, foram 106,7 mil.

Por trás desse aumento das fatalidades, há uma droga específica: o fentanil.

Este opioide sintético é aproximadamente cem vezes mais potente que a morfina e 50 vezes mais forte que a heroína.

 

Dada a potência do fentanil, o consumo de apenas 2 miligramas por um usuário adulto já pode ser letal.

Os obituários não deixam dúvidas. Em 2016, o fentanil estava por trás de 62% das mortes por overdose em Washington. Em 2022, ele foi a causa de 96% das fatalidades ligadas a abuso de drogas.

Especialistas no assunto acreditam que ao menos parte dos mortos sequer sabia que estava consumindo fentanil.

“Um dos maiores problemas nos Estados Unidos é que o fentanil está misturado às drogas em geral. Portanto, qualquer que seja a substância que a pessoa vá consumir, precisamos ajudá-la a saber se há fentanil ali”, explica à BBC News Brasil Angela Wood, chefe da Family and Medical Counseling Services, organização sem fins lucrativos que oferece redução de danos em Washington e opera cinco das oito máquinas da cidade.

"Tentamos educar todo mundo, até mesmo as pessoas que usam apenas maconha, que se você estiver comprando uma droga vendida nas ruas, você precisa se preocupar, porque o fentanil pode estar misturado a ela, e uma única dose pode ser uma dose letal."

De acordo com Wood, desde a instalação das máquinas nas ruas, 1700 itens já foram distribuídos em Washington.

 

O produto mais buscado foi a naloxona, o antídoto nasal contra overdose de opioide capaz de salvar uma vida se aplicada em até 90 minutos após o consumo da droga.

Em segundo, ficaram as fitas que testam imediatamente qualquer droga e identificam a presença de fentanil misturada a elas.

Para Wood, que coordena programas presenciais de distribuição de seringas e de acompanhamento de usuários de drogas na região metropolitana de Washington, o trunfo das máquinas é, por um lado, não exigir qualquer informação do usuário para garantir acesso aos itens de proteção pessoal. Por outro, assegurar que eles estejam disponíveis a qualquer hora do dia e da noite, em qualquer dia da semana.

“Entre aqueles que usam as máquinas, temos visto tanto pessoas que já acompanhamos em outros programas de redução de danos quanto pessoas totalmente novas para nós”, explica Wood.

"Há tanto os usuários de opioides, que buscam se prevenir e ter em mãos uma dose de naloxona, como familiares ou amigos de usuários, que querem poder cuidar de sua pessoa querida caso haja uma overdose."

Segundo o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês), mais de 80% das mortes por overdose acontecem dentro de casa e, em cerca de 40% das vezes, há mais alguém presente no momento da morte — e que poderia ajudar a revertê-la se tivesse o antídoto à mão.


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