No início de março, o Brasil aprovou o plantio e a venda de uma variedade de trigo geneticamente modificada para resistir à seca, conhecida como HB4, e desenvolvida pela empresa argentina de biotecnologia Bioceres.
️ O que muda? O Brasil já importa a farinha com o trigo transgênico para o consumo humano desde novembro de 2021, mas, agora, os agricultores brasileiros vão poder plantar a semente no país. Com isso, o Brasil se tornou a segunda nação, depois da Argentina, a aprovar uma variedade para este fim.
O que é a HB4? É uma semente de trigo geneticamente modificada com o gene HaHB4, proveniente da planta de girassol e resistente à seca.
A variedade também é resistente ao agrotóxico glufosinato de amônio, herbicida aprovado no Brasil que mata plantas daninhas, quando é usado no início do plantio.
Quem aprovou? A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), vinculada ao Ministério da Ciência, responsável por analisar a segurança do alimento para a saúde humana e meio ambiente. A decisão foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) no dia 7 de março.
️Já está liberado? Sim, o plantio está liberado. O Ministério da Agricultura está em processo formal para fazer os registros de Cultivares (RNC) e de Sementes e Mudas (Renasem) do trigo transgênico.
? Somente para o consumo humano, o trigo HB4 já foi aprovado na Austrália, Argentina, Nova Zelândia, Indonésia, África do Sul, Colômbia, Nigéria e Estados Unidos.
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Historicamente, o Brasil sempre dependeu da importação para conseguir abastecer o mercado interno com trigo. Por esse motivo, produtores nacionais veem na liberação da HB4 uma oportunidade de aumentar a produção brasileira, que já vem avançando nos últimos anos.
Mas teve quem não concordou com a medida. Mais de 10 organizações da sociedade civil, entre elas Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e a Associação Brasileira de Agroecologia (ANA), chegaram a pedir ao Conselho Nacional de Biossegurança (CNBS) para barrar a liberação e a importação do cereal transgênico, o que não aconteceu.
Essas associações alegaram que houve violações no processo de aprovação e que há falta de estudos sobre os perigos à saúde e ao meio ambiente.
O grupo também fez uma denúncia no Ministério Público Federal (MPF), que abriu um procedimento para apurar o pedido de revisão da liberação, considerando os impactos no meio ambiente. Por enquanto, o caso ainda não teve outros desdobramentos.
A CTNBio, por sua vez, afirma que a liberação foi feita após pesquisas (veja detalhes abaixo).
O fato é que a HB4 deve demorar para chegar no campo. A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), estatal faz pesquisas voltadas para o campo, está testando se as novas sementes da Argentina têm tolerância à seca, no meio ambiente brasileiro.
A CTNBio afirma que o trigo transgênico é "seguro ao meio ambiente, à saúde humana e animal". Isso com base em "dados da literatura científica" e informações de especialistas, apresentados em uma audiência pública que a Comissão fez.
"Sob o ponto de vista ambiental e da saúde humana e animal, a gente considerou que ele [o trigo transgênico] é similar ao trigo convencional”, disse o presidente da CTNBio, Paulo Barroso, em entrevista à Agência Brasil, no dia 25 de março.
Contudo, a advogada da organização Terra de Direitos e integrante da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) Naiara Bittencourt diz que não há estudos suficientes sobre a segurança do HB4 no Brasil.
"Os estudos que foram fornecidos pela empresa [Bioceres] foram realizados na Argentina e não em território brasileiro. [...] Os estudos que são realizados na Argentina não têm a mesma base necessária que é exigida pelo protocolo de Cartagena de Biossegurança, do qual o Brasil é signatário", afirma.
Segundo Naiara, o protocolo de Cartagena exige, por exemplo, uma análise dos impactos socioeconômicos do cultivo do trigo transgênico, e uma avaliação de risco para a saúde humana de todas as novas sequências de DNA inseridas no genoma do trigo.
Além da falta de estudos, organizações sociais alegam que houve ilegalidade no processo de aprovação da semente. Isso porque a CTNBio teria apoiado a sua decisão técnica para liberar o plantio no mesmo processo administrativo que autorizou a importação do trigo.
"A Lei de Biossegurança (Lei 11.105/2005) é clara ao determinar que a análise de biossegurança e a decisão técnica devem se dar, caso a caso, segundo cada tipo de evento e conforme as distintas finalidades", destaca a carta das organizações sociais, enviada à CNBS.