29/04/2023 às 09h15min - Atualizada em 29/04/2023 às 09h15min

Telegram errou ao não explicar questões técnicas à Justiça, dizem especialistas

Serviço com sede em Dubai (Emirados Árabes) foi suspenso na tarde de quarta-feira (26) por uma determinação da Justiça do Espírito Santo

AB Notícia News
Terra
Dima Solomin / Unsplash

O aplicativo de mensagens Telegram errou ao não deixar claro à Justiça brasileira as dificuldades técnicas de informar os dados requisitados sobre grupos neonazistas. Já a decisão judicial se mostrou acertada, embora com ressalvas. É o que disseram especialistas ouvidos por Byte

O serviço, com sede em Dubai (Emirados Árabes) foi suspenso na tarde de quarta-feira (26) por uma determinação da Justiça Federal do Espírito Santo (JF-ES). Até as 18h desta sexta-feira (28), o serviço continuava fora do ar, segundo testes da reportagem.

 

Segundo a documentação assinada pelo juiz federal Wellington Lopes da Silva, da 1ª Vara Federal de Linhares (ES), e pelo delegado de Polícia Federal Leopoldo Soares Lacerda, designado para o caso, houve um pedido ao Telegram para entregar dados pessoais “de todos os usuários” de dois canais neonazistas, principalmente de seus administradores.

O principal embasamento legal deles para a decisão foi a Lei 12.965/2014, popularmente conhecida como Marco Civil da Internet. Citaram artigos como 7, 10, 12, 15 e 22, que, em resumo, informam que o provedor de um serviço de internet atuante no Brasil — como o Telegram — deve guardar por um certo período dados de usuários como IP (série de números ligada a determinado conteúdo na internet), data, hora, fuso horário e porta lógica usadas.

A não entrega desses dados acarretaria em multas e sanções que, em último caso, levariam até a suspensão temporária do serviço no Brasil. 

O Telegram chegou a fornecer, na sexta-feira (21), as informações dos administradores mas não de todos os usuários do canal e do grupo. A justificativa da empresa é que isso seria impossível, pois o chat já havia sido excluído. A explicação não foi considerada razoável para o descumprimento da ação, diz a Justiça.

Na quinta-feira (27), o CEO do Telegram, Pavel Durov, afirmou em seu canal na plataforma que trabalhava para "preservar a privacidade e a liberdade de expressão" e que o pedido das autoridades brasileiras é "tecnologicamente impossível" de ser atendido.

 

O que dizem os especialistas 

Para Carlos Affonso Souza, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS-Rio), o Telegram errou ao cumprir a decisão brasileira de maneira incompleta e por não explicar porque fez dessa forma.

"Caso essa ordem não seja cumprida, é importante que isso seja esclarecido de uma maneira mais efetiva, o que não parece ter acontecido no caso. Então, o Telegram erra ao não cumprir a ordem judicial da maneira como ela foi editada ou oferecer os argumentos convincentes para o seu não cumprimento", diz.

Por outro lado, opina ele, a decisão do JF-ES carece tanto do dispositivo legal que autoriza o bloqueio total do Telegram no Brasil quanto de uma explicação detalhada sobre a proporcionalidade dessa decisão — isto é, de mensurar que a sanção não afeta só os envolvidos na infração, mas todo o público do Telegram.

"A suspensão se aplica a todos os usuários brasileiros que, de certa forma, vão sofrer as consequências por aquilo que foi postado em um grupo", aponta.

Esta opinião de Souza é parcialmente compartilhada pelo jurista Paulo Rená, codiretor executivo do coletivo jurídico AqualtuneLab e um dos gestores do projeto do Marco Civil da Internet. Em seu Twitter, ele criticou o bloqueio do serviço.

"A ordem de bloquear o Telegram tem base em EVIDENTE desconhecimento das obrigações de guarda de registros de acesso a serviço online no #MarcoCivil. O provedor deve guardar o IP de uso do serviço online, mas não tem dever legal de vigiar todo mundo que usa uma grupo específico!", disse.

Já Gisele Truzzi, especialista em direito digital e fundadora do escritório Truzzi Advogados, defende a decisão brasileira de bloquear o aplicativo de mensagens.

"O juiz anteriormente determinou que o Telegram apresentasse esses dados completos. E o Telegram apresentou somente dados parciais. Então já teve essa oportunidade, e a gente sabe que eles têm essas informações. Tecnicamente, isso é possível, e eles não apresentaram", diz ela, referindo-se ao primeiro pedido da Justiça ao Telegram para quebra de dados dos canais neonazistas, em 19 de abril.

Truzzi cita que o juiz determinou novamente que a empresa apresentasse essas informações. "Novamente, eles não cumpriram, e aí o juiz cumpre a decisão aplicando multa e a suspensão. O artigo 12 do Marco Civil tem as penas que são gradativas. E ele aplicou exatamente essa gradação, Então eu entendo que a decisão foi justa em virtude do ocorrido", argumenta.


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